Resumo |
Esta é uma tese sobre democracia radical. Baseado em uma leitura crítica da aposta latino-americana na participação institucionalizada, busco reconciliar o conceito de democracia com duas noções centrais que, no entanto, são em alguma medida evitadas por grande parte do corpus científico que configura os debates centrais da teoria democrática participativa e deliberativa: o Estado e os modos de vida. O locus da discussão centra-se na agricultura, cuja escolha se dá tanto porque a superação da prática agrícola tradicional, entendida como arcaica, está no cerne da formação dos Estados modernos, quanto porque, atualmente, é o modo de vida camponês que, aliado aos saberes tradicionais quilombola e indígena, apresentam atualmente as principais críticas a esses Estados. Tal reconciliação se dá em dois movimentos. O primeiro, de cunho historiográfico, apresenta uma breve leitura da formação do Estado brasileiro a partir da ótica do formalismo e sua consequência latente, a dialética da ambiguidade. Defendo, contudo, que a formação nacional brasileira não representa um processo interrompido de modernização, mas sim sua faceta caricatural, capaz de explicitar aspectos que, alhures, se veem ocultos. Assim, percorro a formação do Estado brasileiro e seus discursos de pertencimento a partir da modernização agrícola. No percurso, apresento os desdobramentos dessa trajetória na expulsão dos camponeses do campo, divisando um movimento de fuga daqueles que, buscando preservar seu modo de vida, rearticulam-se insurgentemente em espaços de resistência. Sob essa ótica, analiso o fenômeno de politização recente compreendido pela agricultura urbana. O segundo movimento, de cunho etnográfico, aprofunda-se nos conflitos vivenciados por duas hortas urbanas na cidade de Belo Horizonte: a agrofloresta comunitária Coqueiro Verde e a horta comunitária Vila Pinho. A partir de uma vivência prolongada com as agricultoras e os agricultores desses espaços, demonstro como suas reivindicações rompem de maneira insurgente com o formalismo predominante. Ao final, elaboro algumas notas reflexivas sobre uma possível ressignificação do conceito de democracia. Amparado na virada ontológica da antropologia, defendo a noção de democracia emergente pautada em uma ética pragmática da alteridade radical, que propõe a convivência não assimiladora de mundos ambivalentes. |
Palavras-chave |
Agricultura urbana, Ambiguidade, Ambivalência., Democracia deliberativa, Democracia emergente, Democracia radical |